O Plano Anticorrupção do Estado de São Paulo, também conhecido como Programa Radar Anticorrupção, representa um marco importante no fortalecimento da governança pública e no combate à corrupção. Lançado pela Controladoria Geral do Estado (CGE SP), sob a liderança do secretário Wagner Rosário, o plano foi desenvolvido com base em uma visão abrangente e prática dos riscos de integridade a que o serviço público está exposto. Com mais de 513 mil servidores públicos estaduais, o desafio de implementar mecanismos de prevenção, detecção e sanção de irregularidades exigiu um esforço técnico coordenado e uma estratégia bem estruturada.
Desde o início, a equipe responsável adotou como base a experiência adquirida na esfera federal, o que permitiu uma implantação ágil e bem fundamentada. Em apenas três meses, foram mapeadas as normas já existentes no Estado sobre temas relacionados à área de atuação da CGE, os sistemas de controle da administração em vigor e as lacunas institucionais que precisavam ser preenchidas. Com isso, foi possível desenhar uma primeira versão do plano com cerca de 80 ações, que logo se expandiram para 96. Atualmente, quase 70% dessas ações já foram concluídas, demonstrando um alto nível de comprometimento e efetividade da ação de todos os servidores da CGE.
Alcance do Plano Anticorrupção
O Plano Anticorrupção busca estabelecer diretrizes permanentes para a administração pública, estruturando-se sobre três pilares fundamentais: prevenção, detecção e sanção. As ações vão desde a criação de normas e controles internos até a implementação de canais de denúncia, proteção ao denunciante e mecanismos sancionatórios. Esses esforços são voltados à redução da burocracia, à melhoria da governança e à promoção de um ambiente administrativo mais íntegro e transparente. Com isso, o Estado pretende reduzir ocorrências de irregularidades e fortalecer as bases éticas da gestão pública.
Um dos seus diferenciais é a abrangência. Ele se aplica a todos os órgãos da administração direta e indireta do Estado, com exceção das empresas públicas e sociedades de economia mista, que possuem regulação própria conforme a Lei federal 13.303/2016. No entanto, essas entidades também são incentivadas a seguir as diretrizes propostas pela CGE. A iniciativa visa transformar a cultura institucional do Estado, dificultando a reversão de seus avanços mesmo com mudanças de governo.
A transparência tem sido um dos eixos mais visíveis e fortalecidos do programa. Diversas ações foram desenvolvidas para aprimorar o acesso da sociedade às informações públicas, como a adoção do Portal Nacional de Compras Públicas, a disponibilização de dados sobre emendas parlamentares e a criação de painéis públicos que permitem o acompanhamento da execução das ações do plano.
Em janeiro de 2025, por exemplo, foi realizada uma consulta pública que recebeu quase 2.500 manifestações de cidadãos e organizações da sociedade civil, indicando quais bases de dados deveriam ser priorizadas na política de dados abertos do Estado.
Cultura de Integridade
Outro ponto fundamental da estratégia da CGE é a formação de uma cultura de integridade entre os servidores. Considerando que 73% do efetivo estadual está concentrado nas áreas de Educação, Saúde e Segurança Pública, alcançar todos os públicos-alvo com ações de aculturação é um desafio. Muitos desses profissionais atuam em campo, sem acesso contínuo a canais de comunicação internos. Ainda assim, pesquisas de percepção realizadas em 2023 e 2024 demonstram avanços expressivos. A familiaridade com o conceito de integridade pública saltou de 53% para 71%, o conhecimento sobre programas de integridade dobrou e o reconhecimento da existência de unidades de integridade dentro dos órgãos quase triplicou.
A efetividade do plano está diretamente associada ao envolvimento da alta administração. O comprometimento da liderança com a alocação de recursos materiais e humanos para as unidades de integridade é o principal indicador de engajamento, mais relevante que discursos ou comunicados institucionais. Atualmente, 100% dos órgãos do Estado já implementaram suas unidades de integridade, e há um monitoramento contínuo da atuação dessas estruturas para assegurar sua sedimentação e efetividade.
O fortalecimento institucional é também um pilar essencial. Uma nova lei e uma emenda constitucional foram aprovadas para reestruturar a CGE, criando a carreira de auditor estadual de controle. Está em andamento um concurso público para contratação de 200 novos servidores, o que mais do que dobrará a capacidade de atuação da Controladoria. Paralelamente, 14 sistemas estão sendo desenvolvidos para apoiar a gestão de integridade, incluindo temas como nepotismo, conflito de interesses, auditoria e mapeamento de riscos. O objetivo é viabilizar a tomada de decisões com base em dados e evidências, tanto no âmbito da CGE quanto entre os gestores públicos em geral.
Entre os resultados práticos já alcançados, destaca-se a adoção do julgamento antecipado no Processo Administrativo de Responsabilização (PAR). Essa ferramenta permite que empresas privadas assumam responsabilidade objetiva por infrações, colaborem com investigações e reparem danos sem recorrer à Justiça. Em troca, têm suas multas reduzidas e evitam a publicação extraordinária de sua penalidade. Essa abordagem já resultou na recuperação de R$ 9,2 milhões para os cofres públicos estaduais em 2024, representando uma solução eficiente, menos burocrática e mais efetiva que os processos judiciais tradicionais.
Cooperação Técnica com a OCDE
O Estado também está investindo em articulações internacionais para validar e aprimorar sua estratégia. Está em fase avançada um projeto com a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), que prevê uma avaliação independente das normas e ações desenvolvidas para a promoção da integridade em São Paulo, com sugestões de aprimoramento e alinhamento às melhores práticas internacionais. Além disso, a CGE promoverá nos dias 2 e 3 de abril em São Paulo a 1ª Conferência Internacional de Integridade Pública. O evento contará com a presença de especialistas renomados da França, Espanha e da própria OCDE, abordando temas como conflito de interesses, lobby, investigações administrativas e autorregulação da integridade.
O Plano Anticorrupção do Estado de São Paulo marca uma nova etapa no fortalecimento institucional do setor público. Com um modelo robusto, baseado em evidências e conectado às melhores práticas globais, o Estado demonstra compromisso com uma gestão pública ética, transparente e eficiente. À medida que as ações se consolidam, São Paulo se posiciona como referência nacional em políticas de integridade, com capacidade real de transformação cultural e institucional duradoura.
(Texto resultante de entrevista concedida pelo secretário da CGE, Wagner Rosário, para PodCast da ACAMS Brasil Chapter, em 18/03/25).