Em março 2023 o GAFI publicou o guidance sobre beneficiários finais de pessoas jurídicas que pode ser acessado na íntegra pelo link: Guidance on Beneficial Ownership of Legal Persons (fatf-gafi.org)

O GAFI/FATF pediu aos países que usem uma “abordagem multipla” para garantir que informações “adequadas, precisas e atualizadas” sobre os beneficiários efetivos estejam disponíveis para as autoridades competentes. Essa abordagem multipla exige que tanto as empresas quanto o governo coletem e mantenham informações sobre os beneficiários efetivos, o último por meio de um registro de beneficiários efetivos ou mecanismo alternativo.

O GAFI/FATF deixou claro que as informações sobre os beneficiários efetivos devem ser verificadas. Também revisou a Recomendação 24 para exigir que os países avaliem os riscos de lavagem de dinheiro e financiamento do terrorismo para pessoas jurídicas estrangeiras com vínculos suficientes com seu país e tomem medidas para gerenciar e mitigar esses riscos.

A orientação explica tipos e fontes de informações relevantes e mecanismos e fontes para obter essas informações. Destacamos o Capítulo sobre “informações dos beneficiários finais” explica sobre abordagens que podem ser utilizadas para i) Distinção entre propriedade legal e propriedade efetiva; ii)Beneficiário por meio de interesses de propriedade; iii) Propriedade Beneficiária por meio de Controle/Outros Meios (“além do limite”); e propriedade efetiva em relação a diferentes tipos de pessoas jurídicas, além dos demais capítulos que inclui a abordagem multipla, que consiste em combinar informações de, entre outros, as próprias empresas, autoridades públicas em um registro ou mecanismo alternativo, se garantir acesso rápido e eficiente às informações sobre os beneficiários efetivos. As avaliações mútuas do GAFI/FATF demonstraram que os países que usam uma abordagem multiplas foram mais eficazes na prevenção do uso indevido de pessoas jurídicas para fins criminosos e na garantia da transparência da propriedade efetiva do que os países que usam uma abordagem única. Esta orientação é o resultado de vários meses de intensas consultas com partes interessadas externas e do setor privado. Destina-se a auxiliar os formuladores de políticas e os profissionais das autoridades nacionais e as partes interessadas do setor privado na implementação das medidas necessárias para que as empresas de fachada não possam mais ser um porto seguro para rendimentos ilícitos com links para o crime ou terrorismo.

No dia 5 de abril, o evento promovido pela Acams Brasil Chapter, abordou a criação da Lei nº 9.613, de 3 de março de 1998, e a atuação do Coaf para identificar e prevenir operações financeiras ilegais.

A Abertura foi realizada pelo Presidente do COAF, Ricardo Liáo, o qual trouxe um panorama do sistema brasileiro de prevenção à lavagem de dinheiro nos 25 anos do COAF e destacou o avanço na consolidação técnica e operacional da unidade de inteligência financeira e o aprimoramento significativo de seus processos finalísticos, tanto na produção de inteligência financeira, como na supervisão dos setores econômicos, além da divulgação do relatório integrado de gestão 2022 que pode ser acessado no site do Conselho a seguir: rig-coaf-2022-publica-20230308.pdf (www.gov.br)

Liáo também destacou que sob a perspectiva das atividades de supervisão, o Coaf deu continuidade ao aperfeiçoamento do seu arcabouço normativo, com consolidação e harmonização de atos regulatórios, além de haver intensificado o uso da abordagem baseada em risco (ABR) e de ferramentas tecnológicas para otimizar suas ações de fiscalização e decorrentes instauração e julgamento de Processos Administrativos Sancionadores (PAS). Como um dos desdobramentos da primeira Avaliação Nacional de Riscos (ANR) realizada no Brasil e concluída em 2021, o Coaf atuou em diversas ações no âmbito da Estratégia Nacional de Combate à Corrupção e à Lavagem de Dinheiro (Enccla), especialmente aquelas com potencial impacto na 4ª rodada de avaliação mútua do Brasil pelo Grupo de Ação Financeira (Gafi).

Contamos também com a participação do Jorge Caetano, Secretário executivo do COAF, que detalhou a Governança do COAF, os objetivos estratégicos e os avanços que tiveram no aperfeiçoamento dos instrumentos de governança nos últimos 4 anos.

Ana Amélia, diretora de inteligência financeira do COAF, destacou o crescimento exponencial das transações em especie com a inclusão de novos setores economicos, novos atores e novos produtos trazidos com o avanço da tecnologia e detalhou o processo para a produção dos relatórios de inteligência financeira (RIF’s). A produção de inteligência financeira no âmbito do Coaf em 2022 resultou em 13.198 RIFs, os quais consolidaram 527.708 comunicações de operações financeiras provenientes dos setores obrigados, relacionadas a 1.500.832 pessoas físicas ou jurídicas. Atualmente, a base de dados do Coaf reúne mais de 42 milhões de comunicações de operações e, desse total, aproximadamente 7,7 milhões foram recebidas somente em 2022. Nesse mesmo período foram realizados 18.951 intercâmbios de informações com autoridades nacionais e 383 com UIFs de outros países.

Rafael vasconcelos, Diretor de supervisão do COAF, resumiu os 25 anos do COAF em “Risco e efetividade” e que para lidar com universo fiscalizável dessa dimensão, o Coaf tem adotado como estratégias a intensificação da denominada abordagem baseada em risco (ABR) e do uso de ferramentas tecnológicas, o que tem permitido alcançar, simultaneamente, dois objetivos concorrentes: priorizar ações de fiscalização sobre pessoas obrigadas que representem maior risco para o sistema de PLD/FTP e manter a maior presença possível junto aos setores diretamente sujeitos à sua supervisão. Também destacou a importância da a resolução 36, a mais importante desses aprimoramentos que nivelou transversalmente para todos os setores regulados pelo coaf as diretrizes já emitidas pelo BCB, CVM, SUSEP e Previc. Como próximos passos, Rafael trouxe a preocupação com os setores de jóias como continuidade dos trabalhos da supervisão e também ressaltou a importância da qualidade das comunicações realizadas pelos setores obrigados, chamando a atenção para os falsos positivos de instituições que comunicam demais defensivamente até o ponto de sair da proteção do boa-fé.

por Roger Miura

Em janeiro de 2020, foi publicada a carta circular 3.978 do Banco Central, revogando assim a carta circular 3.461 de 24 de julho de 2009, e trazendo à luz novos desafios e oportunidades de melhorias nos controles de Prevenção à Lavagem de Dinheiro e Combate ao Financiamento do Terrorismo (PLD/CFT).

A nova circular é resultado do Edital de Consulta Pública 70/19, de 17 de janeiro de 2019, por meio do qual o Banco Central disponibilizou minuta de ato normativo sobre o tema para comentários, seguindo-se de ampla discussão das sugestões recebidas que durou quase um ano, e que estabelece um novo arcabouço regulatório aplicável as políticas, procedimentos e controles que as instituições financeiras precisam executar, sendo este um tema muito debatido, uma vez que novos itens de controles estão sendo solicitados pelo Banco Central.

Sobre as grandes mudanças na nova circular em relação as políticas e procedimentos, temos a abordagem baseada em riscos (ABR), que é uma metodologia de análise individual que leva em consideração os riscos que podem estar envolvidos, bem com os respectivos controles que devem ser aplicados. Com a implantação da ABR as instituições terão melhor controle e gerenciamento sobre as situações de maior risco, e principalmente em qual direção seus esforços e recursos devem focar.

No quesito controle, uma das obrigatoriedades as quais as instituições reguladas estão se adequando, é a criação do relatório de Avaliação de Efetividade, o qual cita o capítulo XI, artigo 62. “As instituições referidas no art. 1º devem avaliar a efetividade da política, dos procedimentos e dos controles internos de que trata esta Circular”.

  • A avaliação da efetividade será feita anualmente devendo ser relatado no mínimo, as seguintes informações:
  • A metodologia adotada na avaliação da efetividade;
  • A avaliação sobre a governança, políticas, procedimentos e controles implementados;
  • Os testes aplicados seguindo a metodologia definida;
  • Os procedimentos de identificação, qualificação e conhecimento dos clientes,
    funcionários e prestadores de serviços;
  • Os procedimentos de monitoramento, seleção, análise de operações suspeitas para
    comunicação ao COAF;
  • Os programas de capacitação periódicos ou treinamentos internos sobre PLD/CFT;
  • As ações de regularização dos apontamentos de auditoria interna ou externa;
  • As deficiências identificadas nos testes de efetividade e respectivo plano de ação.
    Seguindo o cronograma deste ano para o relatório de teste de efetividade, temos:
  • Data base de 31.12.2020 – Emissão do Relatório/Avaliação da efetividade;
  • Até 31.03.2021 – Envio do Relatório/Avaliação da efetividade a Diretoria da instituição e Comitê de Auditoria/ Conselho de Administração, se houver;
  • Até 30.06.2021 – Envio do Plano de Ação a Diretoria da instituição e Comitê de Auditoria/Conselho de administração, se houver.

Neste artigo, será abordado os passos primordiais para construção do teste de efetividade nos procedimentos de monitoramento, seleção, análise de operações suspeitas para comunicação ao COAF.

Os testes de efetividade do monitoramento devem englobar:

  1. Teste conceitual baseado no regulatório;
  2. Adequação na geração de alertas das operações definidas como suspeitas;
  3. Qualidade das análises em relação as operações suspeitas;
  4. Assertividade das regras de monitoramento;
  5. Assertividade em relação aos processos de KYC;
  6. Qualidade das comunicações enviadas ao COAF.

Este teste deve levar em consideração a revisão das circulares que tratam do monitoramento e seleção de operações suspeitas, sendo a circular 4.001 do Banco Central, a Instrução 617 da Comissão de Valores Mobiliários, e a nova 612 da Superintendência de Seguros Privados, no intuito de identificar quais incisos e situações estão cobertas ou não pela instituição.

Este item é um dos pilares para construção de um monitoramento sólido, então é importante verificar quais produtos e serviços que a instituição dispõe e quais situações devem ou não ser cobertas no monitoramento. Cabe ressaltar que o mapeamento dos produtos e serviços é obrigatório para a matriz de Classificação de Risco.

1. Teste conceitual baseado no regulatório

Este teste deve levar em consideração a revisão das circulares que tratam do monitoramento e seleção de operações suspeitas, sendo a circular 4.001 do Banco Central, a Instrução 617 da Comissão de Valores Mobiliários, e a nova 612 da Superintendência de Seguros Privados, no intuito de identificar quais incisos e situações estão cobertas ou não pela instituição.

Este item é um dos pilares para construção de um monitoramento sólido, então é importante verificar quais produtos e serviços que a instituição dispõe e quais situações devem ou não ser cobertas no monitoramento. Cabe ressaltar que o mapeamento dos produtos e serviços é obrigatório para a matriz de Classificação de Risco.

2. Adequação na geração de alertas das operações definidas como suspeitas

A geração de alertas é a base para construção do monitoramento na instituição, logo o intuito deste teste é identificar se os alertas gerados através das regras do monitoramento foram gerados corretamente, ou seja, se os parâmetros definidos foram aplicados e respeitados com os dados recebidos corretamente.

Os dados para geração de alertas devem respeitar a Confidencialidade, Integridade e
Disponibilidade.

Seguindo os preceitos da Lei Geral de Proteção de Dados (Lei 13.709 de 14 de agosto de 2018), a confidencialidade tem a ver com a privacidade dos dados da organização. Esse conceito se relaciona às ações tomadas para assegurar que informações confidenciais e críticas não sejam roubadas dos sistemas organizacionais, principalmente as informações relacionadas as investigações de situações suspeitas.

A integridade corresponde à preservação da precisão, consistência e confiabilidade das informações e sistemas pela empresa ao longo dos processos ou de seu ciclo de vida, sendo este um item de supra importância para geração correta dos alertas. O recebimento dos dados corretos ou diferente de “nulos” diminuirá a geração de alertas falso-positivos e o respectivo trabalho de análise manual ou automática. O recebimento e utilização dos dados é um tema latente na atualidade, uma vez que os mecanismos de defesa estão sendo aprimorados com ferramentas de inteligência de dados.

O prazo regulamentar para geração do alerta após a realização da operação é de 45 dias, sendo que após esta disponibilização do alerta ao time de análises, há mais 45 dias para dar o devido tratamento, logo a disponibilidade que está relacionada ao tempo e à acessibilidade que se tem dos dados e sistemas da empresa é essencial.

Após os três pilares acima atendidos, é hora de certificar que os dados estão sendo recebidos e processados corretamente pelo sistema de monitoramento da instituição. Neste teste deve ser avaliado se os parâmetros das regras foram respeitados, considerando o conjunto de dados recebidos nas integrações com os sistemas de origem. Fica a cargo da instituição a forma de validação, sendo ela por regra, amostral ou em grandes frentes de monitoramento (conjunto de regras), como também a criação dos indicadores para gerenciamento das deficiências encontradas e a respectiva porcentagem de risco que elas representam.

3. Qualidade das análises em relação as operações suspeitas

Seguindo os conceitos do “done and checked” que algumas instituições já adotam, a ideia é validar se o que está sendo analisado e finalizado está compatível com o alerta gerado, e que a situação alertada realmente não apresenta risco para instituição e para o sistema financeiro.]

Este teste está relacionado ao Quality Assurance dos alertas finalizados, onde será medido a qualidade dos pareceres dado pelos analistas, levando em consideração as informações coletadas, a justificativa atribuída para baixa do alerta, o prazo regulamentar entre geração do alerta e análise, e o status final do alerta (positivo / falso-positivo).

A ideia é que esta avaliação seja realizada em períodos menores do que um ano, para avaliar de forma tempestiva as melhorias que possam ser adotadas no processo de análise de um alerta, bem como a melhoria nos processos de captura das informações e no registro dos dossiês que subsidiam as análises.

4. Assertividade das regras de monitoramento

À medida que o mundo digital vem se consolidando, é cada vez mais nítido que os sistemas de monitoramento devam atuar com maior inteligência e assertividade nos alertas gerados, pois considerando o aumento do número de pessoas “bancarizadas” é natural que o volume de transações aumente, os perfis de clientes e movimentações se alterem e se misturem, e o modus operandi dos lavadores fique mais difícil de se identificar.

Para que esta assertividade ocorra muitas instituições estão buscando apoio nas novas tecnologias que possuem uma abordagem mais eficiente com o uso de modelos, machine learnings, mineração e tratamento de dados, o qual atribuímos o nome de analytics. Cabe ressaltar também o papel fundamental da disseminação da classificação de riscos, abordada fortemente na circular 3.978.

Este teste deve considerar todos os alertas gerados pelo sistema de monitoramento e quais se concretizaram em uma comunicação ao COAF, gerando assim um fator de efetividade da regra. A instituição pode melhorar a assertividade com o uso de analytics ou até mesmo por uma revisão simples de parâmetros definidos na regra, após uma análise amostral do que foi gerado e comunicado ou até mesmo não comunicado. Cabe ressaltar que um baixo resultado de assertividade em uma regra, não implica que a mesma deva ser excluída do programa de PLD/CFT da instituição, e sim melhorada ou agregada a outros fatores de risco.

5. Assertividade em relação aos processos de KYC

Em um programa de Prevenção à Lavagem de Dinheiro e Combate ao Terrorismo é essencial a revisão de todos os processos que compõe o arcabouço regulatório, logo este teste visa identificar possíveis gaps em relação ao processo de “Conheça Seu Cliente” da instituição considerando as comunicações de operações suspeitas de lavagem de dinheiro já realizadas.

Tomando por base as informações consideradas suspeitas de lavagem de dinheiro e comunicadas ao COAF, é importante “refazer” o caminho de entrada do cliente, ou seja, analisar os dados de entrada e as informações de “Conheça Seu Cliente”, no intuito de verificar se estes clientes passaram pela mesa de análise da área de Prevenção à Lavagem de Dinheiro e se possuem fatores de riscos que foram ou deveriam ser apontados no ciclo de vida do cliente anterior ao alerta.

Um item extremamente importante que também deve ser escopo deste teste, é a revisão da matriz de Classificação de Riscos, onde as operações alertadas ou comunicadas devem ser analisadas no intuito de verificar se foi atribuído um peso maior de risco ao cliente, ou se é necessário o refinamento dos parâmetros que ponderam o risco das operações em relação ao cliente.

A execução deste teste é um caminho bilateral onde as informações de situações suspeitas agregaram valor na matriz de entrada e classificação de risco do cliente, bem como os dados de entrada poderão agregar valor na identificação e seleção das operações suspeitas.

6. Qualidade das comunicações enviadas ao COAF

Uma das principais atribuições do Conselho de Controle de Atividades Financeiras – COAF, criado pelo artigo 14 da Lei 9.613/1998, é o recebimento e análise das ocorrências suspeitas de atividades de “lavagem” ou ocultação de bens, direitos e valores.

Todas as operações atípicas enviadas têm papel fundamental no sistema financeiro, pois através destas comunicações os grandes esquemas de lavagem de dinheiro e corrupção no país são desvendados.

Para que estas comunicações sejam utilizadas de forma assertiva pelo COAF, oito quesitos devem ser atendidos, sendo eles:

FONTE: SISCOAF.FAZENDA.GOV.BR/SISCOAF-INTERNET/PAGES/SISCOAFINICIAL.JSF

É necessário a avaliação das comunicações realizadas pela instituição, se elas atendem ou não o crivo regulatório, se estão aderentes e se possuem os fatores determinantes para que esta comunicação possa agregar aos relatórios de inteligência financeira do COAF (RIFs).

Um bom balizador de qualidade das comunicações, é a nota atribuída ao participante pelo próprio COAF, onde nela é possível averiguar quais critérios a instituição atendeu plenamente ou que deveria atender, porém cabe ressaltar a necessidade de estender o teste de efetividade para todas as comunicações realizadas, e não somente as que foram avaliadas pelo COAF, garantindo assim uma melhor efetividade do processo.

Dependendo do volume de comunicações o uso de ferramentas de dados será essencial para
execução desta validação, sendo que pequenos controles podem ser automatizados na criação da comunicação para checagem de alguns dos quesitos solicitados antes do envio ao COAF.


Conclusão final

O relatório de avaliação de efetividade do monitoramento abarca diversas vertentes, as quais juntas estruturam e solidificam o processo de monitoramento, seleção, análise de operações suspeitas para comunicação ao COAF. O acompanhamento dos gaps e melhorias identificadas devem ser controladas e compartilhadas com outras linhas de defesa, para que elas possam validar estes controles periodicamente e de forma independente.

Todo processo bem estruturado e com avaliação contínua tende a agregar valor mitigando riscos e aumentando a eficiência dos processos e utilização dos recursos, sejam eles humanos outecnológicos.

Autor: Roger Miura
Profissional com mais de 15 anos de experiência na área de prevenção à lavagem de dinheiro e projetos tecnológicos voltados para este tema. Atuação em grandes instituições financeiras nacionais e internacionais. Integra a Diretoria Executiva do ACAMS Brasil Chapter, possui o Certified Anti-Money Laundering Specialist (CAMS) e PQO BM&Fbovespa. Bacharel em Ciências da Computação, pós-graduado em Administração Internacional de Empresas pela Fundação Getúlio Vargas e pós-graduado em empreendedorismo pela University of California San Diego.

por Roger Miura

As questões de distanciamento, restrições de mobilidade e proibição da presença física, impactou muito no comportamento dos clientes e consumidores que crescentemente têm buscado fazer negócios através de canais digitais.

De acordo com o relatório do GAFI, a expectativa de crescimento dos pagamentos digitais é de quase 13% ao ano, ou seja, teremos mais de 700 bilhões de transações no mercado. E a previsão é que em dois anos, cerca de 60% do PIB mundial estará nas plataformas digitais.

O Onboarding Digital se tornou uma premissa para competitividade de muitas instituições, e ganhou grande escala em meio a pandemia da COVID-19.

É notório que muitas instituições tiveram que se adequar, e da mesma forma que muitas já possuem tecnologia de ponta para oferecer produtos e serviços, elas devem utilizar essa mesma tecnologia para garantir os controles de Prevenção à Lavagem de Dinheiro na instituição.

Este artigo visa desmistificar o Onboarding Digital falando dos três pilares essenciais que devem ser atendidos para cumprimento do arcabouço regulatório de Prevenção a Lavagem de Dinheiro, lembrando que peculiaridades do processo irão depender do apetite de risco de cada instituição, da gama de clientes, produtos e principalmente do seu foco.

O Onboarding Digital não se trata apenas da captura de dados via um aplicativo, ou uma interface web, mas sim de todo o processo embarcado que faz a coleta, a validação e o tratamento destes dados, para que a mesmo se torne uma informação.

Fazendo uma analogia, o Onboarding é como um processo industrial onde o dado coletado passa por uma esteira e vai sendo tratado e analisado ao longo do processo até seu resultado.

Transformar “dados” em “informações”.

primeiro pilar é verificar a sua aderência a legislação, ou seja, se todos os dados coletados atendem os requisitos mínimos regulatórios, aqui citarei algumas circulares e resoluções relacionadas as instituições financeiras, tais como:

§ Circular 3.680 de Conta Pagamento;

§ Resolução da 4.375 que é a nova resolução 2.025;

§ Circular 3.978 que é a nova 3.461;

§ Instrução CVM 617 que é a nova 301;

§ Instrução SUSEP 612 que é a nova 445.

Além do viés de cadastro, é necessário contemplar o viés de monitoramento, ou seja, verificar se algum dado cadastral é necessário para criação de alguma regra sistêmica.

Esse primeiro pilar que falamos agora, de atender os requisitos legais, é o primeiro grande passo para a construção do seu processo de Onboarding.

segundo pilar é a estrutura da sua esteira, utilizando-se da tecnologia, como o uso de ferramentas de workflow. Parte da sua esteira pode se utilizar do uso de informações públicas ou privadas, sendo que nestes últimos anos muitas empresas inclusive startups se especializaram neste tipo de serviço, de prover dados e informações sobre pessoas físicas e jurídicas, os famosos bureaus (pronuncia-se “birôs”).

O bureau é um conceito velho, mas com novas características e informações, considerando que o “dado” se tornou um dos maiores ativos no mundo competitivo, os bureaus passam a não atender somente a área de crédito, mas agora também as áreas de controle.

O uso dos dados não se limita apenas ao processo de Onboarding, mas também a todo o processo de PLD, como por exemplo o uso de Data Analytics para cruzamento de dados cadastrais e transacionais para determinar os outliers de uma base de dados.

Voltando ao ponto dos bureaus, é muito importante se atentar ao tempo de disponibilização da informação, pois essa informação pública ou privada deve acompanhar o dinamismo das informações dado a tecnologia. A consulta nestes bureaus trarão informações relevantes na construção da sua matriz.

terceiro pilar é a definição da matriz ou árvore de decisão, definir bem quais serão as condições deste processo no intuito de identificar quais situações são aceitáveis, passíveis de aceitação e análise, e aquelas que a instituição não deseja possuir. Aproveitando o processo desta esteira, a matriz de decisão também deve contemplar a matriz de Classificação de Risco, item veementemente citado na nova circular 3.978 do Banco Central.

Nesta matriz de decisão, o processo automático pode direcionar a proposta para aceitação ou recusa automática, sendo a recusa o fim do ciclo onde a Instituição não aceita o risco e não dá abertura ao início de relacionamento com o prospect.

aceitação diz respeito ao prospect que após a triagem não apresenta risco para instituição, ou mesmo que ainda apresente algum fator de risco, possa ser aceito de forma automática. Ressaltando que o prospect que apresenta alto risco não deve ser recusado ou bloqueado, mas sim que a Instituição deva despender maiores esforços e controles de governança sobre este relacionamento, pois tudo dependerá do apetite ao risco da instituição e seus processos de controle.

O terceiro caminho da proposta é a análise, ou seja, a derivação da proposta de início de relacionamento para uma mesa operacional, onde o time analisará com detalhes o prospect. Os dados e as informações que foram agregadas e geradas irão dar ganho de escala e agilidade no seu processo de decisão.

Um exemplo de análise da mesa seria uma pessoa que possui o nome em uma mídia desabonadora, onde deve ser levado em consideração o tempo e conteúdo da mídia, se existe algum processo atrelado e se este processo está em trâmite, se é uma mídia oriunda de um veículo respeitado, se a citação envolve realmente a pessoa como objeto, e só assim é passível a análise e decisão de aprovação ou recusa do prospect.

No tocante da Classificação de Risco citado há alguns parágrafos, essa matriz de classificação é de supra importância neste processo de Onboarding e no ciclo de vida do cliente, onde o cliente já nascerá com uma classificação no primeiro contato com a Instituição, lembrando que está classificação será mutável e dinâmica na vida transacional do cliente.

Em linhas gerais, estes são os pilares essenciais no viés de Prevenção à Lavagem de Dinheiro que devem compor o framework do Onboarding Digital, onde está totalmente estruturado com ferramentas tecnológicas desde o processo de captura, seguido do processo de esteira, do tratamento agregado a dados externos (públicos ou não) e da tomada de decisão com os dados lapidados transformado em informação.

Autor: Roger Miura
Profissional com mais de 15 anos de experiência na área de prevenção à lavagem de dinheiro e projetos tecnológicos voltados para este tema. Atuação em grandes instituições financeiras nacionais e internacionais. Integra a Diretoria Executiva do ACAMS Brasil Chapter, possui o Certified Anti-Money Laundering Specialist (CAMS) e PQO BM&Fbovespa. Bacharel em Ciências da Computação, pós-graduado em Administração Internacional de Empresas pela Fundação Getúlio Vargas e pós-graduado em empreendedorismo pela University of California San Diego.