Os pilares do Onboarding Digital
por Roger Miura
As questões de distanciamento, restrições de mobilidade e proibição da presença física, impactou muito no comportamento dos clientes e consumidores que crescentemente têm buscado fazer negócios através de canais digitais.
De acordo com o relatório do GAFI, a expectativa de crescimento dos pagamentos digitais é de quase 13% ao ano, ou seja, teremos mais de 700 bilhões de transações no mercado. E a previsão é que em dois anos, cerca de 60% do PIB mundial estará nas plataformas digitais.
O Onboarding Digital se tornou uma premissa para competitividade de muitas instituições, e ganhou grande escala em meio a pandemia da COVID-19.
É notório que muitas instituições tiveram que se adequar, e da mesma forma que muitas já possuem tecnologia de ponta para oferecer produtos e serviços, elas devem utilizar essa mesma tecnologia para garantir os controles de Prevenção à Lavagem de Dinheiro na instituição.
Este artigo visa desmistificar o Onboarding Digital falando dos três pilares essenciais que devem ser atendidos para cumprimento do arcabouço regulatório de Prevenção a Lavagem de Dinheiro, lembrando que peculiaridades do processo irão depender do apetite de risco de cada instituição, da gama de clientes, produtos e principalmente do seu foco.
O Onboarding Digital não se trata apenas da captura de dados via um aplicativo, ou uma interface web, mas sim de todo o processo embarcado que faz a coleta, a validação e o tratamento destes dados, para que a mesmo se torne uma informação.
Fazendo uma analogia, o Onboarding é como um processo industrial onde o dado coletado passa por uma esteira e vai sendo tratado e analisado ao longo do processo até seu resultado.
Transformar “dados” em “informações”.
O primeiro pilar é verificar a sua aderência a legislação, ou seja, se todos os dados coletados atendem os requisitos mínimos regulatórios, aqui citarei algumas circulares e resoluções relacionadas as instituições financeiras, tais como:
§ Circular 3.680 de Conta Pagamento;
§ Resolução da 4.375 que é a nova resolução 2.025;
§ Circular 3.978 que é a nova 3.461;
§ Instrução CVM 617 que é a nova 301;
§ Instrução SUSEP 612 que é a nova 445.
Além do viés de cadastro, é necessário contemplar o viés de monitoramento, ou seja, verificar se algum dado cadastral é necessário para criação de alguma regra sistêmica.
Esse primeiro pilar que falamos agora, de atender os requisitos legais, é o primeiro grande passo para a construção do seu processo de Onboarding.
O segundo pilar é a estrutura da sua esteira, utilizando-se da tecnologia, como o uso de ferramentas de workflow. Parte da sua esteira pode se utilizar do uso de informações públicas ou privadas, sendo que nestes últimos anos muitas empresas inclusive startups se especializaram neste tipo de serviço, de prover dados e informações sobre pessoas físicas e jurídicas, os famosos bureaus (pronuncia-se “birôs”).
O bureau é um conceito velho, mas com novas características e informações, considerando que o “dado” se tornou um dos maiores ativos no mundo competitivo, os bureaus passam a não atender somente a área de crédito, mas agora também as áreas de controle.
O uso dos dados não se limita apenas ao processo de Onboarding, mas também a todo o processo de PLD, como por exemplo o uso de Data Analytics para cruzamento de dados cadastrais e transacionais para determinar os outliers de uma base de dados.
Voltando ao ponto dos bureaus, é muito importante se atentar ao tempo de disponibilização da informação, pois essa informação pública ou privada deve acompanhar o dinamismo das informações dado a tecnologia. A consulta nestes bureaus trarão informações relevantes na construção da sua matriz.
O terceiro pilar é a definição da matriz ou árvore de decisão, definir bem quais serão as condições deste processo no intuito de identificar quais situações são aceitáveis, passíveis de aceitação e análise, e aquelas que a instituição não deseja possuir. Aproveitando o processo desta esteira, a matriz de decisão também deve contemplar a matriz de Classificação de Risco, item veementemente citado na nova circular 3.978 do Banco Central.
Nesta matriz de decisão, o processo automático pode direcionar a proposta para aceitação ou recusa automática, sendo a recusa o fim do ciclo onde a Instituição não aceita o risco e não dá abertura ao início de relacionamento com o prospect.
A aceitação diz respeito ao prospect que após a triagem não apresenta risco para instituição, ou mesmo que ainda apresente algum fator de risco, possa ser aceito de forma automática. Ressaltando que o prospect que apresenta alto risco não deve ser recusado ou bloqueado, mas sim que a Instituição deva despender maiores esforços e controles de governança sobre este relacionamento, pois tudo dependerá do apetite ao risco da instituição e seus processos de controle.
O terceiro caminho da proposta é a análise, ou seja, a derivação da proposta de início de relacionamento para uma mesa operacional, onde o time analisará com detalhes o prospect. Os dados e as informações que foram agregadas e geradas irão dar ganho de escala e agilidade no seu processo de decisão.
Um exemplo de análise da mesa seria uma pessoa que possui o nome em uma mídia desabonadora, onde deve ser levado em consideração o tempo e conteúdo da mídia, se existe algum processo atrelado e se este processo está em trâmite, se é uma mídia oriunda de um veículo respeitado, se a citação envolve realmente a pessoa como objeto, e só assim é passível a análise e decisão de aprovação ou recusa do prospect.
No tocante da Classificação de Risco citado há alguns parágrafos, essa matriz de classificação é de supra importância neste processo de Onboarding e no ciclo de vida do cliente, onde o cliente já nascerá com uma classificação no primeiro contato com a Instituição, lembrando que está classificação será mutável e dinâmica na vida transacional do cliente.
Em linhas gerais, estes são os pilares essenciais no viés de Prevenção à Lavagem de Dinheiro que devem compor o framework do Onboarding Digital, onde está totalmente estruturado com ferramentas tecnológicas desde o processo de captura, seguido do processo de esteira, do tratamento agregado a dados externos (públicos ou não) e da tomada de decisão com os dados lapidados transformado em informação.
Autor: Roger Miura
Profissional com mais de 15 anos de experiência na área de prevenção à lavagem de dinheiro e projetos tecnológicos voltados para este tema. Atuação em grandes instituições financeiras nacionais e internacionais. Integra a Diretoria Executiva do ACAMS Brasil Chapter, possui o Certified Anti-Money Laundering Specialist (CAMS) e PQO BM&Fbovespa. Bacharel em Ciências da Computação, pós-graduado em Administração Internacional de Empresas pela Fundação Getúlio Vargas e pós-graduado em empreendedorismo pela University of California San Diego.